De um comentário a respeito de uma situação particular me veio a inspiração de escrever estas linhas. Foi pedido a uma psicóloga que conheço uma palestra sobre motivação em seu ambiente de trabalho. Esta psicóloga trabalha no atendimento a portadores de distúrbios mentais. Seu trabalho não tem nada a ver com palestras de motivação ou Recursos Humanos, de forma que suponho que devam tê-la chamado somente pelo fato de ser psicóloga.
Pois bem. Ao receber um pedido desses, a pergunta que surgiu a ela, e a mim quando me contou, é “o que falar?”. Que tipo de mensagem poderia ter o efeito de motivar as pessoas deste local de trabalho a trabalhar mais e melhor? Como instilar nestas pessoas este estranho sentimento que vem de dentro, essa vontade de fazer as coisas? Que palavras mágicas teriam esse fantástico poder?
Mas ao pensar neste assunto, ao invés de respostas, me surgiram outras perguntas: “Quem são essas pessoas que estarão ouvindo? O que fazem? Por que se supõe que estejam precisando ser motivadas? Onde trabalham estas pessoas? Se realmente estão desmotivadas, que motivos têm para isso?
Pois muito há a dizer sobre motivação. Muito se fala sobre isso todos os dias. Especialistas escrevem artigos e livros sobre isso o tempo todo. Muito há para se falar, então. Mas como selecionar deste muito o pouco necessário, sem saber as respostas para todas estas questões?
Há que se considerar que, na verdade, nem é correto dizer que uma pessoa consiga motivar a outra. Pois para isso teria que ter a capacidade de instalar um sentimento dentro do outro, e isso não é possível. A motivação é sentimento, é energia, e é uma energia individual, que brota de seu interior e o move a frente, em direção aos seus objetivos. O máximo que outra pessoa pode fazer em relação à motivação alheia é despertá-la, caso esteja adormecida.
Mas sempre há que se pensar? “Por que estaria adormecida? Que fatos, que vivências fizeram com essa energia tão importante tenha sido guardada (guardada sim, pois não se perde, apenas se guarda para melhores momentos), tenha ficado adormecida em algum canto da psicologia deste indivíduo?
Pois esta energia, apesar de brotar de nossas fontes internas, não está imune à ação do mundo externo, como de resto nada em nós está. Esta energia tão fundamental sobre severa influência de fatores externos ao sujeito, alheios à sua vontade. Entre esses fatores estão uma série de práticas e políticas de administração que podem colocar essa força para escanteio, para fora do jogo. São controles muito estritos que ameaçam o sentido de autonomia e a dignidade individual de cada um, é a remuneração injusta, as cobranças excessivas, a instabilidade em relação ao futuro, os critérios injustos de reconhecimento e promoção, os favorecimentos de todos os tipos, o ambiente de trabalho poluído por indiferenças generalizadas, a excessiva competição interna, os estilos de liderança ineptos ou inadequados, as falhas de comunicação, a recusa de direitos básicos de justiça… a lista é longa.
E aí, atrapalhando sem perceber a motivação das pessoas por meio de suas práticas inadequadas de gerenciamento essa mesma administração renega a paternidade deste filho feio e pede a um “especialista” de fora que venha, magicamente, em uma palestra de uma ou duas horas, desfazer, no coração e mente das pessoas, os efeitos acumulados de todos estes erros que eles cometeram e que frequentemente ainda cometem. Isso não é possível. Não há o que dizer às pessoas que as faça acreditar em algo que a prática cotidiana de seu trabalho nega.
Em suma situação dessas, em que qualquer um pode perceber que a administração da empresa não busca efetivamente as causas de problemas, não pára para refletir e para considerar o que ela está fazendo que produz o resultado que quer modificar, não há o que dizer para produzir mais que um contentamento momentâneo. Passada a maravilhosa palestra, tudo volta ao que era antes. Depois do passeio no parque, a volta à realidade. Sinceramente, não adianta nada, e ficam o administrador e seu palestrante com cara de “bobos”, de quem vem falar amenidades em meio à guerra.
Convenhamos, nestes caso, a administração é que está precisando de uma palestra, e na verdade bem mais do que apenas uma palestra, quando a pede para seus funcionários. Somente depois desta ter resolvido seus entraves à produção é que uma palestra aos funcionários poderia fazer sentido. Mas, em um efeito paradoxal, uma vez chegada essa hora a palestra motivacional provavelmente não será mais necessária, pois os funcionários já estarão motivados pelos resultados das mudanças que os administradores já fizeram em suas práticas anteriores.
É fácil querer a mudança quando achamos que é o outro que precisa mudar. Difícil é percebermos que nós mesmos estamos precisando mudar primeiro para que o outro mude depois, como conseqüência. Buscar a solução onde ela não está é uma boa maneira de não fazer nada e ainda poder dizer que fez muito. Pena que não resolve nada.
Temos então a resposta àquela pergunta “o que falar?” Para motivar as pessoas, não é preciso falar nada. Precisa é fazer muito.
Texto de autoria do Prof. Rodrigo de Paiva Castro. O Prof. Rodrigo é psicólogo e trabalha na Petrobras no Espírito Santo.
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